Casamento sempre é a troca do desejo pelo amor?
- Bruna de Campos
- 14 de mai.
- 2 min de leitura
Nos relacionamentos longos, muitas vezes nos pegamos em um dilema: escolher a segurança do amor estável ou o fascínio da paixão. Essa escolha, em seu íntimo, não diz respeito apenas ao outro, mas à nossa capacidade de tolerar incertezas e lidar com a vulnerabilidade.
O sociólogo Zygmunt Bauman, em sua obra Amor Líquido, descreve a forma como os vínculos humanos, especialmente os amorosos, se tornam frágeis e transitórios em nossa sociedade. Nossos relacionamentos, muitas vezes, parecem uma busca por segurança emocional e estabilidade em meio ao caos. Quanto mais íntimos nos tornamos, maior é o medo de perder o que conquistamos. E, ironicamente, quanto mais nos apegamos à estabilidade, mais sacrificamos a paixão. Mas, será que não existe outro jeito? Será que o casamento sempre é a troca do desejo pelo amor?
Esther Perel, em Sexo no Cativeiro, aponta que o desejo vive no terreno da incerteza e da distância. Quando nos apaixonamos, mergulhamos num estado de vulnerabilidade, onde nada é certo. Nos tornamos sujeitos ao olhar do outro, e isso nos torna dependentes e inseguros, justamente o oposto da sensação de controle que buscamos ao firmar compromissos. A paixão nos coloca em uma situação de dependência, pois envolve não só o desejo pelo outro, mas a possibilidade de não ser correspondido ou de perder aquilo que nos traz tanto prazer.
A paixão nos coloca em situação de dependência do outro. É difícil se permitir ser vulnerável assim.
Para lidar com esse dilema, buscamos estabilidade. Entramos em relacionamentos, consolidamos rotinas, compartilhamos espaços e sonhos na tentativa de criar um porto seguro. A estabilidade nos conforta, nos acalma e nos protege. Ela nos permite controlar, ou pelo menos tentar controlar, o imprevisível. Mas, ao nos enredarmos nessa teia de segurança, muitas vezes deixamos de lado o espaço para o desejo, que, por sua própria natureza, demanda um tanto de instabilidade.

Na verdade, ao escolhermos a estabilidade, estamos trocando uma fantasia por outra. A paixão é uma fantasia que nos lança ao desconhecido, que acende o desejo, mas que também carrega a promessa da dor e da perda. A estabilidade, por outro lado, é a fantasia de que podemos evitar a dor e viver em paz, esquecendo que, ao minimizar o risco, minimizamos também o fascínio.
Quanto mais íntimos nos tornamos, maior é o medo de perder o que conquistamos. E, ironicamente, quanto mais nos apegamos à estabilidade, mais sacrificamos a paixão.
No fundo, a paixão e a estabilidade são duas faces de um mesmo jogo. E cabe a cada um de nós decidir com qual delas somos capazes de conviver. Podemos nos dar o direito de viver a paixão, entendendo que a verdadeira intimidade não significa eliminar o desejo, mas aprender a conviver com ele em sua plenitude e impermanência.
A decisão de qual fantasia abraçar está em nossas mãos, e a pergunta que fica é: até que ponto estamos dispostos a aceitar que viver é, essencialmente, um jogo de incertezas?
Leu até o fim? Então você já começou.
(O resto, a gente conversa na terapia.)
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