"Estou bem! Só um pouco cansada..."
- Bruna de Campos
- 14 de mai.
- 2 min de leitura
Tenho uma paciente que chegou na terapia com aquele olhar de quem achava que tinha perdido uma família perfeita. E eu, que já vi e vivi mais ilusões do que um mágico em Las Vegas, ouvi com carinho. Porque O LUTO DA FANTASIA É, MUITAS VEZES, MAIS LONGO QUE O LUTO DA VIDA REAL. Mas aí, entre uma lágrima e outra, ela me contou da vez em que passaram pelo setor de segurança do aeroporto.
Era uma viagem em família, daquelas que a gente posta uma foto na praia e escreve “Sorria! Você está na Bahia!”. Mas no detector de metais, a realidade apitou. Lá estava ela: uma criança no colo, outra pela mão, mochila da Galinha Pintadinha pendurada no ombro, o carrinho travando no raio-x, a funcionária da segurança com cara de “me ajuda a te ajudar”, e o pai das crianças… onde? Do outro lado. Tranquilo. Tinha passado só com a mochila dele, retirado seus eletrônicos com a elegância de quem viaja sozinho, e aguardava. Sim, AGUARDAVA. Só se moveu quando a fiscal perguntou: “O senhor pode ajudar sua esposa com seus filhos?”
E não ajudou muito, diga-se. A ajuda veio pela vergonha social, não por impulso de parceria.
Nas sessões pós-divórcio, foram meses em que ela se culpava por estar cansada porque, segundo ela, AGORA tinha que cuidar de tudo sozinha.

Até que, um dia, ela chega na sessão e faz o seguinte relato: ela foi buscar os filhos que passaram o fim de semana com o pai. Ele esqueceu. Estava prestes a sair com as crianças e, ao vê-la, estacionou… do outro lado da rua. Ele desce calmamente, como quem entrega uma pizza do ifood e não uma prole, e senta-se no banco do carro. A nova esposa, coitada, é quem atravessou a rua carregando três mochilas, duas lancheiras, duas pastas de atividades escolares, brinquedos sortidos e duas crianças. Um verdadeiro triatlo.
Foi então que minha paciente, me contou que naquele momento não sentiu raiva. Sentiu clareza. Viu a cena, e entendeu: NUNCA FOI A FAMÍLIA PERFEITA, ERA SÓ ELA CARREGANDO UMA FAMÍLIA INTEIRA.
Então, da próxima vez, pare. Observe. E se pergunte: POR QUE É QUE ELE CONTINUA AGUARDANDO SENTADO NO BANCO DO CARRO?
A resposta pode doer. Mas também pode libertar.
Leu até o fim? Então você já começou.
(O resto, a gente conversa na terapia.)
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